Na literatura encontramos diversos livros que falam sobre o aprendizado organizacional - tantos que fica difícil ler e filtrar os que ralmente abordam o aprendizado "da organização". A maioria deles trata da multiplicação do aprendizado individual e o enclausuramento do conhecimento tácito, legando boa parte do conhecimento como algo não-expressável. Digo isso principalmente porque noto que é mais fácil chamar tácito algo que não conseguimos expressar por pura inabilidade de articulação.
Dessas observações surgem várias questões, das quais destacarei uma para começar nosso diálogo: as organizações podem realmente aprender ou o aprendizado será eternamente individual e não-compartilhável?
Minhas leituras e observações levam a defender que esse aprendizado é possível, mas depende fundamentalmente dos valores da organização. Tentarei fazer um paralelo para tornar mais clara essa perspectiva:
- Aprendizado Individual
O processo de aprendizado é excitado principalmente pelos receptores, que captam informações do ambiente experimentado pelo ser (sentidos). A informação recebida é levada à unidade de processamento (cérebro), onde é combinada ao modelo mental existente (no processo de construção do conhecimento), podendo desencadear uma reação (estímulos enviados aos atuadores, para execução de uma ação).
Vale frisar a existência de órgãos que possuem as funções de receptor e atuador (como as mãos), podendo atuar tanto na captação de informações como na execução de ações. No entanto, as funções são distintas e não simultâneas - sem o comando da unidade de processamento, nada é feito.
Isso nos remete a uma outra questão: há órgãos autônomos, que agem sem que percebamos (ex.: coração) e em seu funcionamento não construímos conhecimento - salvo o conhecimento "sobre" eles, que o ser humano utiliza para intervir em seu funcionamento (cirurgias, drogas etc), que é uma outra experiência.
Outro ponto a ressaltar é que o cérebro atua de forma autônoma, agindo constantemente sobre seu modelo mental, produzindo novos conhecimentos sem a necessidade de uma nova excitação por um receptor.
- Organização como Indivíduo
E, como nos órgãos autônomos, não há aprendizado para a entidade.
- O desafio de compreender o hipércórtex
Por outro lado, também não podemos dizer que o cérebro da organização é a intersecção dos cérebros dos colaboradores. Isso implicaria em uma necessidade de domínio de mua vastidão de conhecimentos por todos os colaboradores. Em uma empresa de software, por exemplo, um implementador deveria conhecer detalhes sobre administração (financeira, recursos humanos...) e todas as áreas envolvidas na manutenção da organização, além das suas atribuições.
Então, conclui-se que em uma organização, as experiências e os conhecimentos nelas produzidos devem estar acessíveis a todas as pessoas que dela necessitem - como os registros em no cérebro, que são geridos apenas por um determinado lobo.
- O papel dos Valores
Uma organização que tem a ambição de aprender deve, então cultivar valores que orientem seus colaboradores a buscar excelência em determinadas áreas de interesse, pois assim estarão incentivando as pessoas a discutir, a propor melhorias, a levantar inquietações. Essas ações, ao contrário de serem infrutíferas, provocam a inovação, o engrandecimento, tal qual a evolução do indivíduo pela ação autônoma do seu cérebro, constantemente reassociando informações apreendidas.
Posto tudo isso, volto a perguntar: as organizações podem realmente aprender ou o aprendizado será eternamente individual e não-compartilhável?
2 comentários:
Excelente a iniciativa de criação do blog! Não dá para não cair no chavão "Pessoas x Processos x Tecnologia". Uma organização que aprende (sim, acredito nelas!) deve ter esse tripé muito azeitado, mas o tempero principal está realmente na cultura, cuja mudança necessita de tempo, organização (em vários sentidos) e perseverança.
Toda geração de valor (não apenas financiero) numa organização desenvolve-se sobre esses trÊs pilares - quem descreve muito bem isso é Tadeu Cruz (se não me engano, no livro "Organização, Métodos e Processos".
E falar em pessoas sempre nos remete à cultura, pois o indivíduo é fruto do meio em que vive (e vice-versa). Outra referência interessante para quem tem interesse nesse aspecto é Habermas (no livro Knowledge and Human Interests).
Espero que cheguemos nessas discussões no futuro, mas acredito que entender o processo de aprendizado é fundamental para promover mudanças nessa tríade que possam trazer benefícios perceptíveis.
Obrigado pela participação!
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